Vida de Defensora Pública: Monique Castellani e a escuta como ponte para a transformação

Filha de uma professora da educação infantil e de um economista que lhe ensinaram a ter disciplina e coragem como maiores qualidades, a manauara Monique Cruz Castellani cresceu cercada de livros e da ideia de que estudo é caminho de liberdade. Entre Direito e Medicina, escolheu o Direito quase na véspera do vestibular, decisão que, pouco depois, ganharia contornos de missão. No Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e como conciliadora nos Juizados Especiais, aprendeu que conflitos têm rosto, voz e contexto. Após breve período na advocacia privada e cargos públicos no Tribunal de Justiça e na Procuradoria-Geral do Município, veio a grande virada: em 2008, tomou posse como Defensora Pública, encontrando no serviço público o elo definitivo entre vocação e compromisso social.

Sua primeira lotação em Itacoatiara foi um divisor de águas. Monique precisou lidar com suprimentos trazidos de Manaus, pesquisas feitas com livros próprios e um fórum com rotinas que se estendiam noite adentro. Por dois anos dividiu os atendimentos com outra Defensora, até assumir sozinha toda a comarca. Foi nesse período que consolidou seu modo de atuar: presença constante, organização rigorosa e, sobretudo, uma escuta atenta. “Antes de um processo, existe uma história”, resume. Cada atendimento exigia mais que técnica jurídica: pedia acolhimento e empatia.

A partir de 2011, dedicou-se à área criminal, passando por varas de crimes comuns, delitos contra a dignidade sexual, tráfico e crimes ambientais. Mesmo atualmente afastada das atividades-fim para atuar na Subcorregedoria-Geral, mantém o aprendizado de que a escuta humanizada é o que singulariza cada caso diante do volume processual. Em audiências de custódia, por exemplo, percebe que muitas vezes não se trata apenas de um réu, mas de alguém sem rede de apoio, documentos ou diagnóstico de saúde. “Quanto mais próximos das necessidades reais da pessoa assistida, melhor fundamentamos os pedidos e mais efetivo se torna o processo”, afirma. No contexto amazônico, onde as distâncias e vulnerabilidades se somam, a Defensoria é a ponte essencial entre direito formal e vida concreta.

A formação acadêmica também alimentou novos caminhos. Durante o mestrado em Direito Ambiental, Monique propôs o projeto Defensoria Consciente, que estimulou a coleta seletiva e o reuso de doações para instituições parceiras da DPE-AM. Mais tarde, ao lado da defensora Dâmea Mourão, idealizou o “Ensina-me a Sonhar”, institucionalizado em 2023. O programa leva rodas de conversa, iniciativas de empreendedorismo, projetos culturais e ações de acolhimento a adolescentes em medida socioeducativa. “Educação em direitos e inclusão social caminham juntas. É disso que nasce esperança”, afirma. Para ela, iniciativas como essa revelam a Defensoria como agente que vai além dos tribunais, propondo políticas públicas, mediando conflitos e devolvendo dignidade a quem vive à margem.

Ao olhar para o futuro, Monique vê a Defensoria Pública como instrumento de transformação que precisa continuar enraizada na vida das comunidades. Reconhece que nem todos os problemas terão solução completa, mas reforça a missão de reduzir sofrimentos e abrir horizontes. “Somos, em muitas situações, a última esperança de quem já se encontra exausto diante das omissões do Poder Público. Embora sejamos poucos, somos profundamente comprometidos e combativos. A quem sonha seguir esse caminho, deixo um convite: estude, esteja perto das pessoas e nunca perca a capacidade de se comover. É assim que a Defensoria transforma histórias, uma escuta de cada vez.”

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