Cara leitora e caro leitor,
O dia 19 de maio chegou mais uma vez, e, tal como no último ano, não poderia deixar
passar em branco um motivo de festa, que, possivelmente, represente de maneira mais
contundente o Estado Social e, porque não dizer, a realização da justiça social. É o dia
da Defensoria Pública!! E farei, junto com você amigo leitor, esse festejo.
Era um dia comum, em uma semana comum, com todos os milhares de afazeres
profissionais e pessoais. A rotina de acordar cedo, arrumar as crianças, sair para a escola,
estava no seu devido lugar. Trânsito pesado, pessoas pedindo nos semáforos, ônibus
espremendo-se entre os carros e motos em seus ritmos frenéticos.
O sol das 7hs da manhã dava os ares de um sol de meio dia. O caminho em direção à
Defensoria Pública traçava curso cotidiano, quando o telefone toca de forma frenética.
Um número desconhecido: “Dr. Estão com um trator aqui na comunidade, estão falando
que temos que pegar nossas coisas e sair, senão vão derrubar tudo”. Era um sinal de
chamado daqueles que são nossos assistidos, os socialmente denominados de
“supérfluos”, de “subclasse” ou de “classe perigosa”.
Prontamente mudei de direção e cheguei ao local. Possivelmente você, caro leitor, já
tenha se deparado com uma cena assim, mas tente imaginar pelo breve momento de
leitura desta crônica. Imagine uma casa feita de madeira, papelão e lona. Media no
máximo 4 por 4 metros. Um banheiro, constituído de um buraco cavado no chão, no
canto da casa. Imagine um casal e 5 filhos menores. Existe apenas uma toalha e uma
escova de dentes para todos. Panelas vazias em cima de um fogão velho, pouquíssimos
móveis gastos. Rostos e olhares cheios de medo e exauridos por uma fadiga social de
exclusão.
Nesse momento, querido leitor, é um daqueles momentos na vida em que a gente se
pergunta: por que Deus nos colocou nesse mundo? Por que Deus nos trouxe aqui para
testemunhar tanto sofrimento? O que essas pessoas fizeram para viver nessas
condições?
O sol, conforme previsto mais cedo, castigava. Como se fala aqui no Amazonas, “era um
sol para cada um”. Como se o próprio sol, cansado de testemunhar tantas misérias ao
longo da história humana, quisesse se vingar daqueles que praticam o mal, como se
quisesse parar com tudo aquilo e a única forma fosse esquentar o máximo possível.
Os olhares se voltaram com a pergunta estampada: “e agora dr.?”, a qual repasso para
você: E agora caro leitor? Ir para a realidade concreta coloca por terra todas as máscaras,
faz a gente se sentir mal. Como você se sente caro leitor? Essas pessoas moram na nossa
cidade, passam medo aqui, acreditam que as coisas vão mudar, que a mão social do
poder público vai as alcançar.
Bem, de política não entendo, mas entendo de sofrimento humano, entendo que muitos
de nós não querem nem ter contato visual com esse povo. Será que isso está assim
somente por culpa dos políticos? Será, caro leitor, que não estamos entorpecidos a tal
ponto pelas questões tecnológicas, globalizadas, receosos da inteligência artificial ou
focados no individualismo liberal?
De outra coisa eu também sei, se Deus nos colocou nesse mundo foi com o propósito de
fazer o bem, resgatar os laços de solidariedade e empatia social, trasbordar amor e
misericórdia. Nesse dia 19 de maio, meu papel de defensor é outro por meio desta
crônica. É, com todo respeito, tentar abrir os teus olhos caro leitor. Veja se teu sentido
de vida está de fato sendo cumprido e se esse sentido não passa em estender a mão aos
excluídos. Essa resposta é só sua, não vou ouvir daqui.
E quanto ao final história? Bem, o final é que o sol se pôs as 18:30, quente como o que
raiava as 7hs da manhã. E as pessoas que estavam na ocupação irregular? A Defensoria
conseguiu reverter a situação? Ai caro leitor, vou deixar para o imaginário de cada um
de vocês, o que sei é que a luta não parou!!!
Deus abençoe vocês!
Thiago Nobre Rosas
Defensor Público